Quando crianças, os adultos sempre nos perguntavam o que desejaríamos ser quando crescêssemos. Esta era uma pergunta muito fácil de se responder; imediatamente, vinham-nos aos lábios as respostas que todos esperavam ouvir: “Quero ser médico, advogado, engenheiro, professor, enfermeira...” Aqueles que diziam coisas como “Quero ser astronauta, escritor, poeta, pintor, bailarina, cantor...”, eram logo dissuadidos de suas ideias malucas. Estas coisas não dão futuro.
Todos nós trazemos por dentro uma vocação adormecida, aquela que jamais recebeu incentivo ou teve respaldo de nossos pais e dos adultos que nos cercavam. Muitos de nós passamos a vida mergulhados em profissões que foram forçadamente ‘escolhidas’ por nós. Talvez por isso o mundo às vezes nos pareça tão cinzento; é que sufocamos a nossa vontade de ser. Eu às vezes me pergunto: como seria o mundo, se todos tivessem se tornado exatamente aquilo que desejavam? Seríamos pessoas mais saudáveis e felizes? Quem sabe, mais abertas e menos rancorosas e violentas?
Imediatamente, este pensamento é repelido para algum recôndito bem profundo de mim mesma; afinal, pensar assim não fará com que eu seja aceita entre as pessoas ‘normais’ e bem-sucedidas que me cercam.
Lembro-me de uma festa na qual minha irmã colocou um karaokê; quando consegui vencer a timidez e segurei o microfone, deixando a voz sair, senti que eu poderia ter passado a vida toda fazendo aquilo! Tive horas muito agradáveis deixando meu sonho acontecer diante daquele número reduzido de pessoas. E percebi que eu tinha talento. Mas ter talento não significa exatamente, obter sucesso. Pelo menos, não o sucesso como as pessoas o entendem.
Quase ninguém quer ser um excelente cantor de bar ou churrascaria, por exemplo; ou um pintor que vende seus trabalhos na praça do mercado. Todos pensamos em shows de TV e galerias de arte; isto sim, é sucesso! E como o nosso sonho de alcançar este sucesso parece tão impossível, tornamo-nos médicos, motoristas, engenheiros, garçons, advogados...
Pensamos que assim, seremos mais felizes! Associamos o nosso grau de felicidade ao salário que nos pagam; quanto mais alto, mais felizes e bem-sucedidos. Sufocamos a nossa vontade de ser, para que possamos dar voz a outras vontades menos importantes.