Mais uma vez, Ana Vagalume publicará um texto que deveria estar nas escrivaninhas do infer... digo, dos Cavaleiros do Apocalipse, mas devido à crise, figurará nas dependências desta séria e compenetrada escrivaninha, em caráter provisório, até que mude. Ou não.
Ia Ana Vagalume a caminhar alegremente pelas ruas e praças movimentadíssimas de Fake City (era dia da votação pelo impeachment) quando, ao passar por um belo jardim cheio de moitas, num canto escondido entre bandeiras vermelhas e camisetas vermelhas, ela escutou um conhecido e familiar soluçar de tristeza e indignação. Ela logo exclamou:
-Minha amiga, a Presidenta (ou será ex-Presidenta?) Dilma Tá Russef!
-Olá, vagalume. Veio aqui para pisar na minha cabeça também?
-Jamais, divina mestra! Vim tentar elevar o seu nível moral... e dizem que nada melhor do que exercícios físicos para conseguir este efeito anti-depressivo! Por que a senhora não vai dar umas pedaladas?
E a Presidenta começa a chhorar ainda mais alto, e Vagalume se desculpa:
-BUÁÁÁÁ!!!
-Oops.. fui mal.
Ao lado da Presidenta, que se encontrava ajoelhada numa poça de lama, causada pela mistura de suas muitas lágrimas à terra da Pátria Mãe Gentil que nunca enjeita, dormia uma cascavel muito parecida com alguém que Ana Vagalume conhecera, mas ela não conseguia lembrar-se quem seria.
Através de um autofalante, Dilma escutava a votação:
-Pela minha família, pelo meu cachorro, pela minha empregada Janete que é gostosa pacas, pela minha mulher que não se separa de mim, apesar da Janete, digo ao povo que voto SIIIMMMM!!!!!
-Pela moralização do país, pela Lava-jato que ainda não chegou até mim, pela minha querida Nação que tanto tem sofrido nas mãos deste governo corrupto (que se recusou a dividir as propinas comigo), eu voto SIIIMMMMM!
-Pelo país, pelo meu filho Joadir, pelo meu falecido pai, que a essa hora está revirando na tumba porque sabe que seu amado filho não tem nem ideia do que está falando, pelos pelos do meu gato, eu voto SIIIMMM!!!
-É com muito pesar que, amando e respeitando a nossa querida Presidenta da República, eu venho aqui para deixar registrado na história, o meu agradecimento ao PT e o meu voto contra o golpe; agradeço a nossa Presidenta e a Lula, que mudaram este país, mas infelizmente, meu partido me mandou votar com eles, ou eu seria mais uma entre os dez milhões de desempregados deste país; portanto, o meu voto é SIIIIIMMMM!!!!!
Dilma chorava copiosamente. Vagalume aproximou-se, tentando segurar-lhe a mão, mas de repente, a Jararaca deu um bote, impedindo-a, pensando que ela estivesse ali para fazer mal à sua querida. Ana Vagalume, recolhendo a mão mais que depressa a fim de salvar-se, ainda pode gritar:
-Calmaí! Eu sou amiga! A-mi-ga!
E a Jararaca, rosnando e espumando pela boca, recolheu-se. Ao ver Ana Vagalume, a Presidenta estendeu-lhe as mãos, e Vagalume, ajudando-a a sentar-se, perguntou:
-O que posso fazer pela senhora, amiga?
-Não desistirei nunca, Vagalume! Daqui eu não saio nem à pedradas! Não vai ter golpe, vai ter LUTA!
-Querida, se você não mudar esse discurso mofado, não vai conseguir se safar... e cuidado, pois o pior pode ainda estar por vir... já pensou na OAB? Seria um golpe ainda maior na sua cabeça. Acho melhor a senhora renunciar.
-Renunciar?! Está ficando maluca?
-É a única maneira de a senhora sair com um pouco de dignidade.
-Tarde demais!
-É, tem razão.
-E nem o Tiririca ficou do meu lado! Pode?!
As bandeiras vermelhas se agitavam com cada vez mais fúria, aos gritos de:
-Vai ter sangue derramado! E vai ser verde e amarelo! Os coxinhas vão ser devorados! País de traidores que não leem, não entendem de política, não conhecem a História!
Ana Vagalume pensou (mas não verbalizou): “Ora, e esse pessoal aí de vermelho conhece a História? Estudou? Vou perguntar a eles onde foi que o Lula se formou, em que faculdade.”
Enquanto isso, passavam bandejas com comida, envelopes contendo trinta e cinco reais e kits passeata, que continham uma camiseta vermelha, uma bandeira vermelha, um Manifesto Comunista e uma caderneta com frases de efeito para serem gritadas durante as manifestações. E Dilma:
-Tanto sacrifício para nada! (chuif)... passei horas cortando pão e colocando mortadela para que o povo não passasse fome, e mandei organizar um bufê de alto luxo para os deputados em Brasília, e mesmo assim, após comerem da minha comida, ainda votaram contra mim!
Ana Vagalume, olhando mais de perto, percebeu que as bandejas dos “trabalhadores” estavam cheias de caviar, lagostas, canapés caríssimos e outras iguarias de fino trato, e as bebidas, eram garrafas de Moet & Chandon, vinhos Chateauneuf du Pape e muito escocês legítimo. Com muito cuidado – pois não queria deprimir ainda mais a Presidenta, Vagalume chamou-lhe a atenção para aquele detalhe:
-Querida... lanchinho luxuoso esse, hein? O povo deve mesmo amar a senhora, e a senhora, o povo!
Ao ver tais iguarias sendo degustadas com as mãos pelo povaréu, Dilma, levando as mãos à cabeça, exclamou, desesperada:
-Ah, não! Mas que meeeerda! Eles trocaram as entregas! Trouxeram a comida que era para o coquetel dos deputados aqui, e levaram os sanduíches de mortadela e o ki-suco para lá!
Ana Vagalume observou:
-Não é à toa que a senhora está perdendo...
Naquele momento, a Jararaca, que estivera quieta durante a conversa, exclamou:
-Mas que droga, hein, querida! Num posso deixa você resolver nada sozinha, que dá merda! Santa incompetência!
Diante daquela bronca, nossa amiga (ex)Presidenta só pode chorar ainda mais copiosamente! E Ana Vagalume, que não desejava ser vista em más companhias, afastou-se dali usando seus óculos escuros estilo Chico Xavier, pensando: