EXPRESSÃO DA MINHA ALMA
Tudo aqui é sobre mim.
Textos
Meu Pobre Ipê Amarelo

 

 



Havia um vaso de terra sob o ipê, onde eu cultivava uma plantinha que não vingou. O vaso acabou ficando por lá um tempo, até que percebi que havia uma mudinha de alguma coisa crecendo dentro dele, brotando corajosamente da terra mal-tratada do vaso. Comecei a regá-la. Em algum tempo, percebi tratar-se de uma muda do ipê amarelo. Replantei-a para os fundos do terreno, e hoje ela já está mais alta do que eu, e já dá flores, embora tenha puxado a mesma magreza de seu pai/mãe ipê.

Quando nos mudamos para esta casa, ele já não ia muito bem de saúde: um tronco magrelo que se dividia em dois galhos ainda mais magrelos nas pontas. Dava algumas flores, porém. Começamos a cuidar dele, e ele cresceu e multiplicou seus galhos, mas nunca chegou à exuberância, mas deu muitas e muitas flores, atraindo a atenção de quem passava pela rua e olhava por cima do muro. Quando ventava, o gramado ficava cheio de manchas amarelas, e eu colhia algumas para colocar na minha fonte.

Houve uma tempestade, e meu manacá da serra foi arrancado do chão com raiz e tudo. Meu enorme mandacarú também não resistiu, mas o ipê, em toda a sua magreza, curvou-se sobre o telhado da garagem sem quebrar. Aos poucos, ele foi voltando ao normal, tal era a sua vontade de viver.

Mas agora, acho que ele está realmente se despedindo, e entendi a sua urgência em deixar-nos um descendente que continue a enfeitar o nosso jardim. Os galhos mais altos estão quase totalmente secos, e quebram-se ao peso dos pássaros maiores que pousam neles. Alguns galhos começaram a brotar bem no meio do tronco, e ao ler um livro sobre árvores, descobri que é uma última tentativa de tentar viver por mais alguns anos, mas que não há salvação para ele. Segundo o livro, quando uma árvore começa a dar galhos muito baixos, é porque a seiva já não chega aos galhos mais altos; ela está morrendo.

O jardineiro acha melhor que o cortemos de uma vez, mas não vou fazer isso com ele. Vou deixá-lo viver enquanto ele quiser, já que luta tanto para permanecer vivo. Tenho certeza que, caso ele esteja em sofrimento e deseje uma eutanásia, arranjará uma maneira de me dizer isso, e então abreviarei seu sofrimento. Enquanto isso, olho pela janela da sala de aula e vejo sua cria a crescer, magrinha, já vencendo a altura do muro que separa a miha casa da casa do vizinho. 

As árvores têm alma, eu tenho certeza. As árvores amam e são gratas. Também sou grata a todas as flores que meu ipê nos deu de presente nesses dezesseis anos que moramos aqui. Cuidarei bem de sua cria.

Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 13/08/2020
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